"O médico me machucava a ponto de eu me urinar na cama quando ia fazer os exames de toque. Em certo momento, ele adentrou à sala com um cigarro na mão. Só fui observada depois de 14 horas e ele estourou minha bolsa com os dedos.
Deitada naquela mesa horrenda, a médica me cortou sem a anestesia ter pego direito. Outro médico apareceu e pressionou minha barriga com o antebraço "para agilizar, porque a gente quer ir tomar um café". Na hora de suturar o corte, eu reclamava que estava sentindo tudo e ela, como sempre, ignorava.
Quando fui ter minha segunda filha comecei a sentir pânico porque relembrei de tudo. Eu me senti humilhada e desrespeitada, porque não podia fazer nada pelo meu próprio corpo".
Relato de Clara*, 26 anos, Rio de janeiro.
Desde maio de 2014, o deputado federal Jean Wyllys (PSOL/RJ) tramita um projeto de lei para formalizar o conceito de violência obstétrica. O PL 7633/14 (clique aqui para saber mais) não busca criminalizar as agressões, mas estabelecer que a violência obstétrica existe e quais infrações se encaixam na definição.

A professora de direito Aline Albuquerque, pesquisadora da área de direitos humanos, explica que não existe uma tipologia específica para "violência obstétrica". No entanto, as violações sofridas pela mulher no processo de parto podem ser enquadradas em delitos já existentes na legislação brasileira. “Poderia ser enquadrada, por exemplo, como injúria ou lesão corporal, que são infrações já previstas no código penal".
A especialista defende que o foco principal, no entanto, não deve ser na punição de profissionais, mas na conscientização, prevenção e educação em prol de uma nova mentalidade. A advogada afirma que é importante caracterizar e denunciar casos de violência obstétrica para assim possibilitar mais discussões e reflexões sobre o tema. “Isso pode gerar sanções administrativas e também com relação à ética dos profissionais, de forma a punir os profissionais relacionados à violência. Mas o principal é formar uma nova educação, uma nova cultura”.